sexta-feira, 30 de março de 2012

O intolerante Millôr de 64

Tenho um livro da notável (não famosa!) peça Liberdade, Liberdade do Millôr e Flávio Rangel. O texto reúne citações com ideias de liberdade, através dos tempos MESMO! Passando pelo Iluminismo, Império Romano, ditadores, filósofos, Jesus Cristo e o próprio Millôr. Deixo aqui minha homenagem com um trecho de um artigo seu (publicada na Revista Pif-Paf de 1964, a charge também) citado nesta peça. Seus textos são ironicamente imortais, contando e fazendo história, este é um deles;

Mas, afinal, o que é a liberdade? Eu lhes garanto que a liberdade existe. Não só existe, como é feita de concreto e cobre e tem cem metros de altura. A liberdade foi doada aos americanos pelos franceses em 1866. Recebendo a liberdade dos franceses, os americanos a colocaram na ilha de Bedloe, na entrada do porto de Nova Iorque. Esta é a verdade indiscutível. Até a agora a liberdade não “penetrou” no território americano. Quando Bernard Shaw esteve nos EUA foi convidado a visitar a liberdade, mas recusou-se afirmando que seu gosto pela ironia não ia tão longe. Aquelas coisas pontudas colocadas na cabeça da liberdade ninguém sabe o que sejam. Coroa de louros certamente não é. Antigamente era costume coroar-se heróis e deuses com coroas de louros. Mas quando a liberdade foi doada aos EUA, nós, os brasileiros, já tínhamos desmoralizado o louro, usando-o para dar gosto no feijão. A confecção da monumental efígie custou à França trezentos mil dólares. Quando a liberdade chegou aos EUA, foi-lhe feito um pedestal que, sendo americano, custou muito mais do que o principal:
quatrocentos e cinqüenta mil dólares. Assim, o preço da liberdade é de setecentos e cinqüenta mil dólares. Assim, a liberdade põe em cheque a afirmativa de alguns amigos nossos, que dizem de boca cheia a frase importada, que o ''Preço da Liberdade é a Eterna Vigilância''. Não é. Como acabamos de demonstrar, o preço da liberdade é de setecentos e cinquenta mil dólares. Isso há quase um século atrás. Porque atualmente o Fundo Monetário Internacional calcula o preço da nossa liberdade em três portos e dezessete jazidas de minerais estratégicos.
 

Millôr Fernandes

Um comentário:

Anônimo disse...

Glorioso!